Serra retém verba da USP, Unesp e
Unicamp
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FÁBIO TAKAHASHI
da Folha de S.Paulo
Pela primeira vez desde a obtenção da autonomia
universitária, em 1989, o governo estadual paulista
reteve, neste ano, recursos destinados à USP, à
Unesp e à Unicamp. A contenção de verbas feita pelo
governo José Serra (PSDB) ocorreu de duas formas.
Uma delas foi por meio da suspensão do repasse
mensal para as instituições.
Em uma das suas primeiras medidas após tomar posse,
Serra determinou o contingenciamento (reter
temporariamente parte do Orçamento) de 15% do
custeio e 100% dos investimentos dos órgãos do
governo. Em contingenciamentos anteriores, inclusive
no do ano passado, as universidades não sofreram com
a medida.
A outra retenção ocorreu por meio da diferença que
deveria ser repassada referente à arrecadação de
dezembro do ICMS (principal imposto paulista).
Mensalmente, as três escolas recebem 9,57% da
previsão da arrecadação do ICMS. Caso o arrecadado
seja maior do que o previsto, o governo paga a
diferença no mês seguinte. Em janeiro deste ano, o
dinheiro não foi repassado integralmente.
Devido às duas ações do governo, a Unesp recebeu
apenas R$ 2,4 milhões dos R$ 12,7 milhões no último
dia 22. A instituição afirma que teve de usar suas
próprias reservas para pagar despesas com o hospital
universitário, bolsas e aquisição de material. Já a
Unicamp recebeu R$ 5,5 milhões a menos e teve de
cortar compra de materiais e a assinatura de
periódicos.
A USP informou uma perda de R$ 11,5 milhões e
afirmou que ainda avalia tal impacto. O secretário
de Ensino Superior, José Aristodemo Pinotti, disse
que o contigenciamento é pequeno e que trabalha para
revertê-lo.
Para o coordenador do curso de administração pública
da Unesp (Araraquara), Álvaro Guedes, não há
impedimento jurídico para que o governo faça
contingenciamento. "Mas é um sinal de que o
tratamento vip às universidades irá parar."
Conselho
Outra mudança que teve impacto negativo nas
universidades foi o fato de os reitores não
predominarem mais no Cruesp, conselho que os
representa. Até então, o conselho era formado pelos
três reitores, sendo um presidente, e os secretários
de Ciência e Tecnologia (ao qual às escolas eram
vinculadas) e o de Educação. Com a criação da
Secretaria do Ensino Superior, o conselho passou a
ter três secretários e três reitores, sendo que a
presidência passou para o titular da pasta de Ensino
Superior.
Uma das principais medidas discutidas no Cruesp são
os reajustes salariais. Ontem, Pinotti disse à
Folha que não será mais o presidente do órgão
--o posto voltará a ficar com os reitores. Antes de
saber da decisão, o reitor da Unicamp, José Tadeu
Jorge, afirmou que "houve uma redução da autonomia
com a perda das prerrogativas dos reitores no
Cruesp". Sobre as medidas financeiras, ele disse: "O
contingenciamento abre um precedente perigoso na
gestão das universidades".
Já o vice-reitor em exercício da Unesp, Herman
Jacobus Cornelis Voorwald, concorda que há o risco
de a autonomia ser afetada. "A mudança do modelo de
autonomia, iniciado em 1989, coloca em risco a
manutenção da qualidade do ensino, da pesquisa e da
extensão nas três universidades", disse. A reitora
da USP, Suely Vilela, declarou que "as mudanças
propostas pelo governo mostram pontos fundamentais
que precisam ser aperfeiçoados".
Outro lado
O secretário de Ensino Superior, José Aristodemo
Pinotti, afirmou que o contingenciamento 'é pequeno'
e negou que haja intenção de alterar a autonomia das
universidades.
A reportagem procurou também a assessoria do
governador José Serra (PSDB), que disse que apenas o
secretário Pinotti responderia às questões.
Sobre o contingenciamento das parcelas mensais às
universidades, o titular da pasta disse que o
governo tomou cuidado para que a medida não
atingisse a folha de pagamento, responsável por 90%
das despesas dessas instituições.
'Por isso esse contingenciamento não tem tanta
importância. Mesmo assim, estou negociando com [as
secretarias da] Fazenda e Planejamento para que isso
não ocorra', disse.
Sobre o repasse da diferença da arrecadação do ICMS,
Pinotti afirmou que não pôde destinar integralmente
os recursos porque o Orçamento 2007 não foi
aprovado.
Dessa forma, essa transferência teve de seguir a
lógica da distribuição das cotas mensais --ou seja,
o pagamento de apenas 1/12 do valor a cada mês.
A assessoria de imprensa da Unesp afirmou que, em
outros anos, mesmo com o Orçamento ainda não
aprovado, não havia retenção desses recursos, devido
ao fato de a verba já ter sido aprovada na lei
orçamentária do ano anterior (no caso em questão, de
2006).
A Secretaria de Ensino Superior declarou que
desconhece tal fato e afirmou que só poderá repassar
a verba integralmente quando ela constar do
Orçamento 2007 e ele for aprovado na Assembléia
Legislativa.
Com relação ao temor de que haja uma mudança na
autonomia universitária, Pinotti negou tal intenção.
'Para que isso fique mais claro, pedi que o
governador me retire da presidência do Cruesp. A
decisão deve ser publicada no 'Diário Oficial'
amanhã [hoje].'
A reitora da USP, Suely Vilela, foi avisada ontem
que voltará a chefiar o conselho. A presidência tem
vigência de um ano e é alternada pelos reitores.
Colaborou EVANDRO SPINELLI, da
Reportagem Local