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TENDÊNCIAS/DEBATES
Portal da Capes é modelo de acesso à
ciência
MARCO ANTONIO RAUPP, JACOB
PALIS JR. e LUIZ EUGÊNIO ARAÚJO DE MORAES MELLO
Se não fosse o Portal de Periódicos da Capes, nosso
país como um todo estaria à margem do acesso ao
conhecimento
O ACESSO livre e gratuito a
revistas e publicações científicas tem sido objeto de
artigos publicados neste e em outros jornais, sobretudo
comparando os modelos de outros países (EUA e Reino
Unido) e minimizando os esforços e avanços já alcançados
pelo Brasil nessa área. A defesa dessa lógica parece
razoável.
Se a ciência é primariamente paga pelo dinheiro público,
então seu resultado deve ser igualmente desse mesmo
público e, portanto, de livre acesso. Mas publicar tem
um custo, mesmo na internet. Quando há trabalhos de
editoria, avaliação e revisão de texto, esses custos
aumentam.
A inserção brasileira no cenário científico
internacional cresceu exponencialmente nos últimos anos.
O Brasil ocupa hoje a 15ª posição no ranking de produção
científica mundial, fruto do esforço da comunidade
científica e da avaliação continuada dos programas de
pós-graduação.
O sistema de pós-graduação, que cresce ao redor de 15%
ao ano, associado ao sistema de avaliação, foi
responsável em grande parte pelo incremento qualitativo
e quantitativo da nossa produção científica.
Lançado em novembro do ano 2000, o Portal de Periódicos
da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior) constitui o instrumento mais importante
na disseminação da informação científica no Brasil e um
recurso indispensável à produção científica e
tecnológica nacional.
A um custo de US$ 35 milhões, o portal dá acesso a 188
instituições, das quais 156 o fazem inteiramente de
graça. Estas incluem as instituições de ensino superior
federais, os Cefets, as estaduais e municipais com pelo
menos um curso de pós-graduação nota quatro e as
privadas com pelo menos um curso de pós-graduação nota
cinco.
Nessas instituições, o acesso individual a essa
gigantesca biblioteca é permitido a todos estudantes,
servidores e professores. Nas bibliotecas dessas
instituições, o acesso é permitido ao público em geral.
O portal disponibiliza o conteúdo atualizado sobre as
descobertas científico-tecnológicas mundiais de todas as
áreas do conhecimento, sendo uma das maiores bases de
dados eletrônicas do mundo.
Sua filosofia é ímpar na comunidade científica. Seu
custo, quando analisado em função da sua distribuição
geográfica igualitária e democrática, pelo impacto na
graduação, na pós-graduação e na extensão e pela
importância no desenvolvimento científico e tecnológico
do país, é irrisório.
Os 51 milhões de artigos baixados em 2007 resultaram num
custo de US$ 0,72 por artigo, o que está muitas vezes
abaixo do valor que seria cobrado por acessos
individuais ou mesmo fotocópias.
Em grandes universidades norte-americanas, como a Ucla,
o custo da assinatura eletrônica de cerca de 11 mil
periódicos e bases de dados atinge US$ 11 milhões anuais
-restrita exclusivamente aos profissionais dessa
universidade. Para Harvard, esse valor atinge US$ 27
milhões.
O custo médio para as instituições brasileiras, levando
em consideração somente aquelas de acesso gratuito,
atingiu em 2007 o valor de US$ 237 mil/instituição. Os
dados mostram que o portal da Capes oferece um acesso
semelhante ao de Harvard ou Ucla a um custo 114 ou 46
vezes menor do que aquelas duas instituições.
O acesso livre, na verdade, envolve pagamento pela
publicação. Supondo que toda a produção científica
brasileira indexada em 2007 houvesse sido realizada em
periódicos de acesso livre imediato, os cofres públicos
teriam arcado com uma despesa de cerca de US$ 24
milhões, assumindo um custo médio de cerca de US$ 1.000/
trabalho, quase o custo do portal.
Esses artigos estariam abertos ao domínio público, mas
as nossas instituições, se todo o investimento fosse
direcionado para somente "open access", estariam sem
acesso à maior parte da produção científico-tecnológica
mundial.
Num mundo ideal, o acesso seria livre e gratuito a
todos. No entanto, a realidade é outra. E, se não fosse
o Portal de Periódicos da Capes, nosso país como um todo
estaria à margem do acesso ao conhecimento, e nossa
ciência, certamente, não teria tido o avanço claramente
constatado dos últimos anos.
MARCO ANTONIO RAUPP, 69, doutor em matemática, é
presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência). JACOB PALIS JR., 67,
doutor em matemática, é presidente da ABC (Academia
Brasileira de Ciências). LUIZ EUGÊNIO ARAÚJO DE
MORAES MELLO, 50, doutor em neurofisiologia, é
presidente da FeSBE (Federação de Sociedades de Biologia
Experimental).
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