São Paulo, sexta-feira, 11 de julho de 2008
 

 
 
 

 

TENDÊNCIAS/DEBATES

As universidades na década vindoura

JACQUES MARCOVITCH

Espera-se que o Brasil acadêmico aprofunde a análise do fenômeno da internacionalização e faça as melhores escolhas

A UNIVERSIDADE é uma instituição-chave para que a próxima década venha a ser mais próspera e mais justa. Nenhuma outra instância pode contribuir de forma tão direta para o avanço científico-tecnológico, a emergência de bons quadros profissionais e a formação de novas mentalidades.
Essa constatação nos leva à expectativa de que universidades brasileiras, especialmente as bem situadas na área de pesquisa, mirem o ano de 2020 como horizonte para a sua integração no seleto grupo das cem melhores do mundo, periodicamente identificadas no Academic Ranking of World Universities.
Além dessa prova de reconhecimento externo, cabe-lhes avaliar outras tendências de internacionalização adotadas no mundo desenvolvido. Importantes academias européias, como a Sorbonne, ou americanas, como a New York University, vêm expandindo suas atividades de ensino e pesquisa no exterior, sobretudo no mundo árabe, com expressivo financiamento de governos locais.
Cremos não haver, na história recente, exemplo mais impactante de ousadia em matéria de internacionalização e competição no ensino superior. E há outras referências. A China, por exemplo, já explicitou a determinação de incluir duas de suas universidades (Pequim e Tsinghua) no grupo das cem melhores do mundo, hoje constituído em sua maioria por instituições dos Estados Unidos e do Reino Unido. As universidades americanas há muito se preocupam com a classificação no US News & World Report, as européias visam o suplemento de ensino superior do "Times". Mas todas, em todo o mundo, miram os levantamentos por critério de desempenho feitos pelos pesquisadores do Instituto de Educação Superior da Universidade de Jiao Tong, de Xangai. A iniciativa chinesa do Academic Ranking of World Universities reflete o interesse daquela potência emergente em conhecer as universidades capazes de receber seus jovens e inspirar o desenvolvimento interno do ensino superior. É nesse processo que o governo daquele país investe cerca de 80 milhões de dólares por ano como recursos adicionais em duas instituições já referidas.
Além dos Estados Unidos e do Reino Unido, que lideram a classificação geral no ranking, outros países, cujo idioma nacional não é a língua inglesa, possuem universidades que apresentam desempenho considerável em áreas específicas.
Um quadro divulgado em 2008 revela que Japão, Suíça, Suécia, Alemanha, Holanda, Israel e China têm dez ou mais universidades ocupando um dos lugares entre as cem melhores universidades em áreas de ensino/ pesquisa estudadas pelo Academic Ranking of World Universities. Entre as universidades brasileiras, a USP ocupa, em 2008, o 92º lugar no grupo de cem melhores universidades nas áreas de medicina e farmácia.
Como entender as instituições que participam de um seleto grupo de cem melhores no amplo universo de mais de 4.000 universidades espalhadas pelo mundo? Os fatores apontados por especialistas que estudam as universidades de destaque global incluem concentração de talentos, destaque mundial em pesquisa, fluxos financeiros previsíveis e elevada capacidade de articulação com a sociedade.
Uma articulação entre os fatores acima citados pode gerar uma sinergia, por enquanto insuficientemente explorada no Brasil, e que vem obtendo aceleração inédita em outros países, aproximando a universidade e o corpo social. Projetos nessa direção terão o país como principal beneficiário e o desenvolvimento social como desfecho -o que interessa a todos os cidadãos.
A academia é por si mesma uma revolução permanente, com etapas que se antecipam ou retardam, conforme decisões exigidas pelos contextos históricos. Os gestores universitários, em todo o mundo, defrontam-se agora com um cenário de mudanças jamais verificado na longa história do ensino e da pesquisa. Trata-se de um processo em plena evolução e que deve ser cuidadosamente observado. Essas mudanças não ocorrem somente no exercício da profissão acadêmica, mas também na estrutura administrativa das instituições.
As universidades devem olhar para longe, entender o que acontece além dos limites nacionais, para reduzir cada vez mais as margens do desconhecimento. Tendo por horizonte o novo período que começa em 2010, espera-se que o Brasil acadêmico aprofunde, nos próximos 20 meses, a análise do fenômeno da internacionalização e faça as melhores escolhas.

JACQUES MARCOVITCH 61, é professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP. Foi reitor da USP (1997-2001) e secretário de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo (2002, gestão Alckmin). É autor de livros "Universidade Viva", entre outros livros.