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TENDÊNCIAS/DEBATES
As universidades na década vindoura
JACQUES MARCOVITCH
Espera-se que o Brasil acadêmico aprofunde a análise do fenômeno da
internacionalização e faça as melhores escolhas
A UNIVERSIDADE é uma instituição-chave
para que a próxima década venha a ser mais próspera e mais justa. Nenhuma
outra instância pode contribuir de forma tão direta para o avanço
científico-tecnológico, a emergência de bons quadros profissionais e a
formação de novas mentalidades.
Essa constatação nos leva à expectativa de que universidades brasileiras,
especialmente as bem situadas na área de pesquisa, mirem o ano de 2020 como
horizonte para a sua integração no seleto grupo das cem melhores do mundo,
periodicamente identificadas no Academic Ranking of World Universities.
Além dessa prova de reconhecimento externo, cabe-lhes avaliar outras
tendências de internacionalização adotadas no mundo desenvolvido.
Importantes academias européias, como a Sorbonne, ou americanas, como a New
York University, vêm expandindo suas atividades de ensino e pesquisa no
exterior, sobretudo no mundo árabe, com expressivo financiamento de governos
locais.
Cremos não haver, na história recente, exemplo mais impactante de ousadia em
matéria de internacionalização e competição no ensino superior. E há outras
referências. A China, por exemplo, já explicitou a determinação de incluir
duas de suas universidades (Pequim e Tsinghua) no grupo das cem melhores do
mundo, hoje constituído em sua maioria por instituições dos Estados Unidos e
do Reino Unido. As universidades americanas há muito se preocupam com a
classificação no US News & World Report, as européias visam o suplemento de
ensino superior do "Times". Mas todas, em todo o mundo, miram os
levantamentos por critério de desempenho feitos pelos pesquisadores do
Instituto de Educação Superior da Universidade de Jiao Tong, de Xangai. A
iniciativa chinesa do Academic Ranking of World Universities reflete o
interesse daquela potência emergente em conhecer as universidades capazes de
receber seus jovens e inspirar o desenvolvimento interno do ensino superior.
É nesse processo que o governo daquele país investe cerca de 80 milhões de
dólares por ano como recursos adicionais em duas instituições já referidas.
Além dos Estados Unidos e do Reino Unido, que lideram a classificação geral
no ranking, outros países, cujo idioma nacional não é a língua inglesa,
possuem universidades que apresentam desempenho considerável em áreas
específicas.
Um quadro divulgado em 2008 revela que Japão, Suíça, Suécia, Alemanha,
Holanda, Israel e China têm dez ou mais universidades ocupando um dos
lugares entre as cem melhores universidades em áreas de ensino/ pesquisa
estudadas pelo Academic Ranking of World Universities. Entre as
universidades brasileiras, a USP ocupa, em 2008, o 92º lugar no grupo de cem
melhores universidades nas áreas de medicina e farmácia.
Como entender as instituições que participam de um seleto grupo de cem
melhores no amplo universo de mais de 4.000 universidades espalhadas pelo
mundo? Os fatores apontados por especialistas que estudam as universidades
de destaque global incluem concentração de talentos, destaque mundial em
pesquisa, fluxos financeiros previsíveis e elevada capacidade de articulação
com a sociedade.
Uma articulação entre os fatores acima citados pode gerar uma sinergia, por
enquanto insuficientemente explorada no Brasil, e que vem obtendo aceleração
inédita em outros países, aproximando a universidade e o corpo social.
Projetos nessa direção terão o país como principal beneficiário e o
desenvolvimento social como desfecho -o que interessa a todos os cidadãos.
A academia é por si mesma uma revolução permanente, com etapas que se
antecipam ou retardam, conforme decisões exigidas pelos contextos
históricos. Os gestores universitários, em todo o mundo, defrontam-se agora
com um cenário de mudanças jamais verificado na longa história do ensino e
da pesquisa. Trata-se de um processo em plena evolução e que deve ser
cuidadosamente observado. Essas mudanças não ocorrem somente no exercício da
profissão acadêmica, mas também na estrutura administrativa das
instituições.
As universidades devem olhar para longe, entender o que acontece além dos
limites nacionais, para reduzir cada vez mais as margens do desconhecimento.
Tendo por horizonte o novo período que começa em 2010, espera-se que o
Brasil acadêmico aprofunde, nos próximos 20 meses, a análise do fenômeno da
internacionalização e faça as melhores escolhas.
JACQUES MARCOVITCH 61, é
professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da
USP. Foi reitor da USP (1997-2001) e secretário de Economia e Planejamento
do Estado de São Paulo (2002, gestão Alckmin). É autor de livros
"Universidade Viva", entre outros livros. |