Previdência piora sob Lula, diz nova conta
O novo critério -que, segundo o governo, torna mais claras as causas e as dimensões do déficit- isola das contas as receitas e despesas do setor rural, subsidiado pela legislação, e soma às receitas as estimativas de benefícios fiscais baseados na contribuição ao INSS.

Novo metódo de cálculo das contas do INSS mostra que resultados negativos começaram em 2003, no início da gestão petista
Em 2002, último ano da gestão FHC, houve superávit de R$ 4,533 bilhões; no ano seguinte, as contas do INSS tiveram déficit de R$ 903 mi
GUSTAVO PATU
LEANDRA PERES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Recém-proposta pelo governo, a nova metodologia para contabilizar os resultados do Instituto Nacional do Seguro Social aponta que o déficit da Previdência começou no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O novo critério -que, segundo o governo, torna mais claras as causas e as dimensões do déficit- isola das contas as receitas e despesas do setor rural, subsidiado pela legislação, e soma às receitas as estimativas de benefícios fiscais baseados na contribuição ao INSS.
Com base em dados oficiais, a Folha calculou, a partir dessa metodologia, o resultado da Previdência desde 2000. Os números mostram uma brusca piora em 2003, na estréia da administração petista.
Até 2002, as contribuições de trabalhadores urbanos -somadas aos benefícios fiscais dados a entidades filantrópicas e a micro e pequenas empresas- era suficiente para bancar aposentadorias, pensões e auxílios em casos de doenças e acidentes nas cidades.
Naquele ano, o superávit foi de R$ 4,533 bilhões, com queda de 24,3% em relação aos R$ 5,992 bilhões de 2001. Mas em 2003 a deterioração do resultado é muito mais evidente, com um déficit de R$ 903 milhões.
O motivo foi a disparada das despesas, que cresceram 22% em relação ao ano anterior, a maior taxa do período. E não se pode culpar o reajuste do salário mínimo da época -apenas 1,2% superior à inflação.
Confrontada com os dados, a Previdência -que, até então, só havia divulgado os resultados de 2006- enviou na sexta-feira uma série histórica à Folha. Os dados coincidem até 2002, mas o cálculo para benefícios fiscais a partir do governo Lula é diferente dos utilizados pela reportagem, a partir de tabela oficial publicada em anexo ao Orçamento da União de 2006.
A nova versão oficial registra superávit de R$ 322 milhões em 2003 e déficit de R$ 1,843 bilhão em 2004. Também nesse cenário, a piora do resultado se acelera na gestão Lula.
Debate da Previdência não terá "tabu"
Fórum vai "abrir a caixa" do sistema, dizem ministros; entre os pontos que serão analisados está a idade mínima para aposentadoria
Preocupação do governo é com o déficit atual, o grande número de idosos em 2050 e a inclusão no sistema de 28 milhões de pessoas
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Fórum Nacional da Previdência Social, a ser instalado hoje pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não terá "tema tabu" e deverá "abrir a caixa" do sistema, segundo os ministros da Previdência Social, Nelson Machado, e da Fazenda, Guido Mantega.
"Nenhum assunto será tabu. Só não queremos contaminar a discussão, que deve ser de longo prazo, com assuntos da agenda de curto prazo. É preciso separar bem", diz Mantega.
O governo não vai apresentar uma proposta fechada, mas deseja debater temas considerados polêmicos principalmente pelas centrais sindicais.
Entre eles estão o estabelecimento de idade mínima para a concessão de aposentadorias aos trabalhadores do setor privado -provavelmente 60 anos para os homens e 55 anos para as mulheres-, mudanças na cobrança da contribuição patronal -que hoje incide sobre a folha de pagamentos- e alterações nas regras para o acúmulo de benefícios e para o cálculo das pensões.
"Não é o momento para colocar propostas, mas para lançar a discussão sobre as condições efetivas da Previdência, abrir a caixa", completa Mantega.
O ministro concorda com a idéia de fazer uma separação das contas da Previdência, retirando o que é assistência social.
"Sempre é bom caminhar para uma contabilidade mais precisa, mas isso não diminui o tamanho do buraco. Nós temos um buraco de R$ 42 bilhões.
Pode dividir o buraco em dois ou três, mas ele vai continuar existindo", disse, lembrando que o importante é buscar uma solução para o déficit.
Na apresentação do diagnóstico, Machado diz que o Fórum precisa discutir assuntos como as mudanças demográficas no país previstas para os próximos 40 anos, as fontes de financiamento da Previdência, além de debater como incluir cerca de 28 milhões de trabalhadores que hoje não pagam nenhuma contribuição ao INSS.
O ministro chama a atenção para o fato de que em 2050, segundo estimativas do IBGE, o Brasil terá 14 milhões de pessoas com mais de 80 anos -hoje não chega a 2 milhões.
Etapas
Machado quer dividir os debates do Fórum em três momentos. A discussão terá início com a apresentação do diagnóstico por técnicos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, órgão ligado ao Ministério do Planejamento), especialistas e pesquisadores de universidades ligados ao tema, além da OIT (Organização Internacional do Trabalho), convidada para apresentar as experiências de outros países.
Numa segunda etapa, serão colhidas as propostas dos integrantes do Fórum e só depois o governo buscará consenso em torno do que deve ser feito.
O ministro, porém, acha que o Fórum não deve ter a atribuição de escrever o projeto de emenda constitucional para uma nova reforma previdenciária. Segundo ele, esse trabalho deve ser feito por técnicos e advogados, respeitando as diretrizes do Fórum.
A CUT (Central Única dos Trabalhadores), um dos integrantes do Fórum, ainda não decidiu se vai participar. A reunião da executiva que discutirá o assunto e também as propostas que a entidade poderá levar para o governo só será realizada a partir de amanhã.
A Força Sindical, outra entidade que falará em nome dos trabalhadores, defenderá mudanças no cálculo da contribuição patronal (para que parte incida sobre a folha de salários e parte sobre o faturamento) e também a unificação do sistema previdenciário, para que inclua os servidores públicos e militares. A definição de uma idade mínima encontrará resistência da central sindical.
A primeira reunião do Fórum está marcada para o início de março, no Ministério da Previdência, quando será definido o cronograma dos trabalhos, que devem durar seis meses.
Colaborou LEANDRA PERES , da Sucursal de Brasília
Folha de S. Paulo