As relações, as condições e a natureza do trabalho docente vêm sendo profundamente precarizadas. O fato de que o crescimento do número de funções docentes tem ocorrido majoritariamente nas IES privadas é a primeira evidência desse processo. O maior crescimento de empregos universitários deu-se no setor onde historicamente se verificam as piores condições de trabalho. Em regra, nesse setor os contratos de trabalho são estruturados apenas em carga horária de ensino. Como exemplo, tem-se atualmente que, das 185 mil funções existentes nas IPES, 118 mil são caracterizadas por regime horista, sem expectativa de plano de carreira e de desenvolvimento de atividades de pesquisa e de extensão. No caso do setor público, o raquítico crescimento das funções docentes também aconteceu sob a marca da precarização, já que, das 33 mil funções geradas entre 1980 e 2004, cerca de 21 mil referem-se às jovens IES públicas estaduais que nasceram exibindo formasalaciosamente criativas de contratação. Além dos contratos temporários e efetivos baseados em horas-aula (pagamento por aula e ausência de plano de carreira), tem sido prática corrente o recurso às bolsas de pesquisa e adicionais a título de extensão como forma de remuneração dos docentes. Mesmo em universidades consolidadas como a UNESP, a expansão deu-se, principalmente, pela extensão dos docentes já efetivos para os novos campi e pela contratação de docentes por períodos de 3 meses, regime de trabalho chamado de professores conferencistas. Some-se a esse quadro a política generalizada de arrocho salarial no sistema público que leva o docente a vender cursos e diversos tipos de serviços.
Ironicamente denominadas de apoio às instituições públicas, as fundações privadas passam a desempenhar papel privilegiado, rompendo o princípio republicano da separação entre os entes públicos e os interesses privados numa afronta evidente à Constituição brasileira.
Outro aspecto da precarização do trabalho do docente pode ser visto no aumento do próprio trabalho, na carga didática nos cursos de graduação e crescimento dos cursos de pós-graduação que somente nesses últimos dez anos teve seu número duplicado, intensificando a carga de trabalho referente a aulas e orientações. Além disso, a pressão exercida para intensificar o trabalho do docente impõe metas de produção acadêmica que são aumentadas ano após ano. Tal pressão encontra-se alicerçada na idéia de que os docentes devem ser mais “produtivos”, aumentando a quantidade de “produtos” como aulas, orientações, publicações, projetos, patentes etc. À medida que esse padrão produtivista se torna a essência do trabalho do docente, fatores como a competição por bolsas, por editais de financiamento para pesquisa e até mesmo pelos primeiros lugares nessa hierarquia acadêmica tornam-se por si mesmos os critérios de avaliação das atividades docentes pouco importando a qualidade final do trabalho. É a chamada avaliação em si referenciada. Além disso, esse modelo passa a determinar a estruturação da pesquisa no interior das instituições privatizando o uso de todos os meios de produção acadêmicos (livros, laboratórios etc), já que estes se apresentam cada vez mais concentrados e disponibilizados para as áreas “vocacionadas” para o mercado. Nessa lógica competitiva, não há espaço para todos. Ao contrário, ela é estruturalmente excludente da maioria e utiliza apenas como emblema a qualidade como justificador da exclusão que lhe é intrínseca. Quem não se adapta é praticamente impedido de concorrer aos editais dos órgãos de fomento à produção científica sendo ejetado do sistema.
Por tudo isso, a modificação dessas condições que precarizam o trabalho docente articula-se com a luta mais ampla de defesa da expansão com a luta mais ampla de defesa da expansão com qualidade da educação pública e gratuita. Alinha-se a essa luta a pauta salarial, a estruturação de plano de carreira dos docentes nas IES que ainda não os têm, a contratação de professores efetivos as IES públicas, a democratização dos editais de órgãos de fomento à produção científica, o aumento dos recursos para Ciência, Tecnologia, Pesquisa e Desenvolvimento, a discussão dos critérios de produção e de avaliação do trabalho do docente (especialmente os que imperam hoje a partir da CAPES), enfim, a problematização da rotina da atividade do docente como forma de organizar uma outra lógica baseada em valores coletivos, solidários e estruturados democraticamente.
O ANDES-SN coloca-se nessa arena de luta visando a produzir ações capazes de recolocar o trabalho do docente no nível de dignidade que lhe deve ser próprio e, mais, que se exercite sobre fundamentos capazes de recuperar o ambiente acadêmico em que prevaleça na universidade a docência e a pesquisa guiadas pelas questões teóricas de real conteúdo e pelos verdadeiros problemas nacionais.